20 de abril de 2006

Já li «Deus Caritas est» (Deus é amor)

Em Janeiro falei-vos aqui da primeira encíclica de Bento XVI, «Deus Caritas est» (Deus é amor).
Deixo-vos agora alguns excertos:
"Os gregos - aliás de forma análoga a outras culturas - viram no eros sobretudo o inebriamento, a subjugação da razão por parte duma «loucura divina» que arranca o ser humano das limitações da sua existência e, neste estado de transtorno por uma força divina, faz-lhe experimentar a mais alta beatitude. (...) Nas religiões, esta posição traduziu-se nos cultos da fertilidade, aos quais pertence a prostituição «sagrada» que prosperava em muitos templos. O eros foi, pois, celebrado como força divina, como comunhão com o Divino". O Antigo Testamento combateu esta forma de religião, "(...) como perversão da religiosidade. Ao fazê-lo, porém, não rejeitou de modo algum o eros enquanto tal, mas declarou guerra à sua subversão devastadora, porque a falsa divinização do eros, como aí se verifica, priva-o da sua dignidade, desumaniza-o. (...) O eros necessita de disciplina, de purificação para dar ao ser humano, não o prazer de um instante, mas uma certa amostra do vértice da existência, daquela beatitude para a qual tende todo o nosso ser".
Bento XVI dá um grande avanço (depois, obviamente, de repetir o dogma de que o ser humano "é composto de corpo e alma"): "Se o ser humano aspira a ser somente espírito e quer rejeitar a carne como uma herança apenas animalesca, então espírito e corpo perdem a sua dignidade". E reconhece (embora fale como se fosse «passado» o que é algo de tristemente actual) que "hoje não é raro ouvir censurar o Cristianismo do passado por ter sido adversário da corporeidade; a realidade é que sempre houve tendências nesse sentido". Houve?!
Mantém a defesa do amor "no sentido da exclusividade - «apenas esta única pessoa» - e no sentido de ser «para sempre»". Mas insiste em algo que me parece muito sensato e «revolucionário», ao ligar os conceitos de amor de atracção (eros) e amor incondicional, de entrega (agape): "No fundo, o «amor» é uma única realidade, embora com distintas dimensões; consoante os casos, pode uma ou outra dimensão sobressair mais. Mas, quando as duas dimensões se separam completamente uma da outra, temos uma caricatura ou, de qualquer modo, uma forma redutiva do amor". Nisto, estou totalmente de acordo.

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